Livro: Uma História Incomum Sobre Livros e Magia
Título original: A Tale of Highly Unusual Magic
Autor(a): Lisa Papademetriou
Editora: Arqueiro
Páginas: 192
ISBN: 978-85-8041-506-3
Sinopse: Kai chega ao Texas para visitar sua tia-avó Lavinia – uma senhora extravagante, durona e fã de hip-hop. Do outro lado do mundo, no Paquistão, Leila deseja ser tratada como uma princesa pela família de seu pai e viver fortes emoções. Elas só não fazem ideia de que seus mundos completamente diferentes estão prestes a se chocar graças a um enigmático livro em branco. Quando Kai escreve no livro, suas palavras magicamente aparecem no exemplar de Leila. As meninas então percebem que O Cadáver Excêntrico reage a cada frase acrescentada – não importa se foi inspirada pelo ataque de um chihuahua ou por um mal-entendido com uma cabra – com um trecho da história de amor vivida por Ralph Flabbergast e Edwina Pickle mais de cinquenta anos antes. Uma história incomum sobre livros e magia entrelaça essas três perspectivas – de Kai, Leila e Ralph – de uma forma divertida e emocionante. É uma narrativa mágica sobre o destino e os laços invisíveis que nos ligam uns aos outros.

A autora Lisa Papademetriou, que já escreveu diversos livros publicados no Brasil, e teve seu primeiro romance considerado um dos melhores do ano de 2006, segundo o site FamilyFun, agora chega com Uma história Incomum Sobre Livros e Magia, nos fazendo mergulhar em um universo completamente diferente de tudo o que já vimos e em uma ficção que bem poderia ser realidade. Suas paisagens revelam as inspirações de Lisa, que conheceu seu marido paquistanês e nos habitua ao cenário do Paquistão, ao mesmo tempo em que nos mostra um novo mundo – não tão perfeito quanto se esperaria – estadunidense no Texas.

    Kai e Leila são duas garotas que ainda se encontram na pré-adolescência e pertencem a mundos aparentemente diferentes. Kai sempre teve o pai – que morreu antes que ela pudesse conhecê-lo – como um espelho para sua inspiração, já que era um ótimo violinista, porém, nunca teve a oportunidade de seguir seus sonhos, e por isso, Kai pretende fazer isso por ele ao aspirar tocar um dia em uma orquestra. A menina treina todos os dias, incentivada por sua mãe a seguir em frente com uma rotina intensa de treinamentos exaustivos. Mas um dia, Kai se decepciona e viver com a mãe acaba tornando-se complicado. Então se muda temporariamente para a casa de sua tia-avó no Texas, onde se envolve em muitas aventuras e descobre que há um novo sentido para a música que toca no violino de seu pai.
    Leila vivia em Houston com sua família e achava que tudo lá era pacato e sem graça. Além do mais, vivia sempre à sombra da perfeição de sua irmã, Nadia, que apesar de ter praticamente a mesma idade que ela, parece ser sempre o centro das atenções por ser a filha mais habilidosa, viajada e engajada em várias causas sócio-ecológicas. Leila já não suportava mais e resolveu mudar de ares, viajando assim para o Paquistão, onde vivia a família de seu pai. Lá ela descobre um mundo onde tudo pode ser exótico e fantástico. No início, Leila se decepciona quando percebe que as aventuras que a esperam ali não parecem tão instigantes como em seus livros “água com açúcar” preferidos. Mas logo descobre que pode ser responsável pelo próprio final feliz.
    Logo no início, Kai e Leila encontram, de formas diferentes, o livro O cadáver excêntrico, que é o cerne da narrativa. Os exemplares passam a interagir com as meninas a partir do momento em que se interessam por ele, mesmo que vagamente. Mas, com o passar do tempo, elas descobrem uma forte ligação com aquele achado e não passam somente a interagir com o livro – dito mágico – mas entre elas. Em lados opostos do mundo, as duas garotas sentem-se impactadas pela história de amor de Ralph e Edwina, que lhes é exposta no livro, e torcem para que tudo termine bem entre eles, mas mal desconfiam que, apesar de toda a magia contida ali, aquela história pode ser mais real do que imaginam.

     Este foi um livro que andou sendo comentado em vários lugares e me deixou instantaneamente curiosa, mesmo nunca tendo lido nada da autora. Confesso que logo me atraí pela capa e depois pelo título. Mas ao ler sua sinopse, fiquei realmente encantada e ansiosa para lê-lo. Dei-me conta que se tratava de um daqueles livros que – mesmo tendo uma história mais curtinha – conseguia prender facilmente e assim me levaria a me aventurar no mundinho dele, com uma história fantástica e – não pude negar – com um toque infantil. A obra correspondeu exatamente ao que eu imaginei, mas dez vezes melhor.
    A narrativa ocorre em terceira pessoa e tem um narrador onisciente. Algo interessante é que, em muitos momentos da história, a narradora interage com o leitor, e se torna até divertido, deixando a narrativa mais dinâmica, porque, há determinados trechos em que se pode perceber que ela esconde algumas coisas a respeito da história de forma proposital, para nos instigar a ler e descobrir os mistérios que ela planta. Ainda assim, não se envolve muito – o que também deixa espaço para que conheçamos por nossa própria conta o que a história tem a nos revelar – mas é o suficiente para lembrar aos leitores quem é que está narrando.
    O foco narrativo muda a cada capítulo entre Leila e Kai, e ao final de cada um, há uma parte revelada do livro que elas descobrem, pois significa que mais um capítulo fora escrito magicamente para que as meninas possam ler. Nesses momentos, o foco muda para Ralph e Edwina, e, mesmo a história do tal livro seja rápida e relatada em pouquíssimas páginas ao final dos capítulos, ela tem a capacidade de envolver de forma impressionante não apenas as protagonistas, mas também a nós, leitores.

“- Tudo é mágico – disse. – O céu, as estrelas, o mundo inteiro. É um milagre se a gente pensar bem” (Pág. 104).    


   Na nota inicial de Lisa Papademetriou, ela revela sua ligação com o Paquistão e toda a cultura de lá: seu marido é paquistanês. De início já conhecemos a familiaridade que ela tem com o país e o porquê de ela falar com tanta propriedade sobre ele. Ela mostra o lugar através da visão da personagem Leila, já que é o primeiro contato dela com o lado Oriental do mundo, e é exatamente isso que marca: Lisa já esteve em seu lugar em algum momento e está retratando todas as sensações. Daí o motivo da narrativa parecer tão real.
   As protagonistas têm personalidades ainda em formação, mas são muito bem definidas quanto à maioria das coisas, além de determinadas, e, apesar de terem vidas distintas e passado por experiências diferentes, são muito semelhantes na forma como pensam e agem – sonhadoras e ao mesmo tempo hesitantes, um pouco medrosas a respeito do mundo como um todo, já que ambas viveram sob superproteção de suas famílias, mas ao mesmo tempo curiosas, dispostas a explorarem tudo e descobrirem coisas novas. Dentre os protagonistas, também se pode incluir Ralph, e apesar de sua participação não ser tão direta quanto à das outras protagonistas, ele foi o verdadeiro responsável pelas aventuras que elas vivem.
    Os secundários são tão cativantes quando os primários. Doodle, a menina lepidopterologista (pessoa que estuda borboletas e mariposas), logo se torna a melhor amiga de Kai, já que é vizinha de sua tia-avó (outra personagem daquelas fáceis de gostar). Sendo vista como uma garota estranha, a única que ainda se interessa por pesquisas em bibliotecas na cidade, é ela quem leva Kai a desvelar o mistério das mariposas-celestiais e também faz com que ela retome sua paixão pelo violino por uma causa nobre. Já no Paquistão, a família tradicional (mas não tanto assim) de Leila não é das melhores, mas ela descobre que não são tão ruins quanto pensava e aos poucos vai desfazendo seus preconceitos. E mesmo os antagonistas foram capazes de me cativar, mesmo que fossem apenas para arrancar-me algumas risadas.


     A obra foge totalmente de clichês. O que vemos em excesso na literatura são tragédias pelas quais sofremos, e, mesmo que os personagens dos quais gostamos tenham finais felizes, eles se tornam tão artificiais que roubam um pouquinho da alegria que o desfecho deveria ter (aquela coisa de: após tantos percalços, finalmente ele encontrou sua felicidade). Nunca havia parado para pensar na complexidade que tudo isso tem no meio literário até ler Uma história incomum sobre livros e magia – e então notei que o título realmente corresponde à forma como a história se desenrola. É incomum e ao mesmo tempo parece tão real que é inevitável não carregar uma dose do otimismo que ela leva, para nossas próprias vidas.
    A capa ficou simplesmente fascinante, digna de congratulações. Ela retrata cada partezinha que se faz importante do enredo, desde as formas de mandala ao redor e as curvas que contornam o centro – que lembra a cultura paquistanesa – até a mariposa no topo, que, por sua vez, tem uma participação muito importante para as descobertas das protagonistas. As sombras de paisagens mostradas no topo do início dos capítulos conversam muito bem com as mudanças e semelhanças entre as personagens para o qual o foco narrativo volta-se. Além disso, transmite toda a singeleza que a história contém.
    Uma história incomum sobre livros e magia mostra que nem tudo é um mar de rosas, assim como também não se trata de um pesadelo o tempo todo. Nos traz uma leitura bastante leve e – infelizmente – rápida, que nos faz refletir e dar boas gargalhadas ao se aventurar junto com Kai e Leila, e também descobrir um pouco sobre o mundo inocente e mágico em que elas vivem – e que não é somente delas ou exclusivo desta obra. Ele pode ser nosso. E pode ser incrível também.

Primeiro parágrafo: “Ninguém nunca tinha dito a Kai que ela devia prender a respiração ao passar por um cemitério, mas ela prendeu mesmo assim. Segurou o fôlego e agarrou com força o puxador da porta da imensa picape Dodge 1987 azul-clara, enquanto sua tia-avó Lavinia, ao volante, passava correndo e aos solavancos por um grande portão de ferro, subindo a entrada para carros até a casa. Kai observou através do vidro sujo as cruzes antigas e as lápides brancas, caindo aos pedaços, que pareciam espiá-la de trás do velho portão de ferro”.
Melhores quotes: “Não sabia que, às vezes, encontrar um amigo de verdade pode nos fazer perceber melhor a solidão que há na nossa vida até aquele momento”.
“Então eu quero um final feliz.
Você e todo mundo, pensou Kai [...]. Bom, então faça acontecer”.



Um Comentário

  1. Já ouvi muitos comentários sobre esse livro, ainda não li, mas estou muito curiosa, fiquei ainda mais com vontade depois de ler que é um livro que foge dos clichês.
    http://souadultaagora.blogspot.com.br/

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